segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Carta desconhecida para Marília.

A tragédia está dada há mais de vinte e cinco anos. Tenho vinte e sete, e ela só mudou de cara (como eu). É uma situação difícil de controlar, como um câncer. É a tragédia. Só tende a piorar com o passar do tempo. Tem sido assim. A minha vontade? Importa? Vivo em, na, sob, sobre a tragédia. Ela gosta de mim, me estupra. Me violenta. Tenho pressa de matá-la. A tragédia que não é minha, mas me foi herdada...  dada.

Imaginação fértil para tudo. Inclusive contando todas as vezes que puta que pariu, eu pensava que Marília poderia morrer. A morte, mais que a tragédia - se não for obra dela, tirou meu foco. Aliás, o atraiu. Só quero evitá-la. Marília, não morra. Marília, não é isso que dizem de você. Marília, me escute. Mande-o para o inferno; assim como eu farei. É só questão de tempo. Que maravilha vai ser vê-lo agonizando, Marília, sofrendo um  décimo do que você passou. Dorme, querida, mas não para sempre. Você é, ainda, minha ternura, minha razão.

Se de uma coisa me arrependo na vida, Marília, é ter confiado na Ciência. Deus foi para o beleléu. Agora bem que eu o queria para pedir sua bênção e voltar para onde dizem que eu iria: para a eternidade.
Agora, nem Deus tenho para isso. Só me resta esperar a apoptose celular ou tomar coragem, Marília. Mas não se preocupe. A vida há de me dar uma solução. A nossa.